No próximo dia 20 se comemora em todo o Brasil o Dia
Nacional de Zumbi e da
Consciência Negra. A lei que instituiu esta comemoração foi
sancionada há uns dois
anos pela presidente Dilma Rousseff, que, ao assinar o
documento ignorou uma velha
reivindicação do movimento nacional para que incluísse a
data no calendário de feriados
nacionais. Este projeto havia sido criado como Dia Nacional
de Zumbi em 2003 por
sugestão da senadora pelo Mato Grosso, Serys Slhessarenko,
curiosamente descendente
de ucranianos.
Mas ao tramitar na Câmara dos Deputados houve um
substitutivo que propôs a
inclusão da data na relação dos feriados nacionais. Quando
voltou ao Senado, a idéia
foi rejeitada, embora naquele parlamento tome assento um
representante da população
negra, o senador Paulo Paim, do PT do Rio Grande do Sul. Mas
deixemos as discussões
do alto parlamento de lado e nos transportemos para a nossa
querida e muito amada
Parnaíba.
Eu nunca fui muito ligado nesse negócio de empunhar bandeira
por esta ou aquela
causa, mesmo porque na condição de jornalista, embora seja
raro entre minha categoria,
sempre fui desses que perseguem a imparcialidade embora seja
difícil. Tenho um amigo
que não acredita muito nessa posição. Respeito seu ponto de
vista. Mas de uns tempos
pra cá, nesses vinte anos de vida social e profissional em
Parnaíba pude acompanhar
algumas situações curiosas em relação ao negro ou o que
sobrou dele.
Da mesma forma que em nossa região está ausente qualquer
traço do indígena, o
elemento negro segue este mesmo caminho, o esquecimento, na
verdade a diluição, a
diminuição de sua importância. Parnaíba nunca tratou de
preservar seus valores, sua
história, seus traços econômicos, sociais e políticos, até
mesmo para, aproveitando estes
elementos planejar seu futuro. E muita coisa interessante
foi dizimada pela falta de
cuidados, falta de respeito e irresponsabilidade.
Parnaíba que teve como elemento formador de sua força de
trabalho e sociedade nos
séculos XVIII e XIX o negro cativo das fazendas de gado, dos
carnaubais e babaçuais
e mais próximo de nós o estivador do Porto Salgado, o
carregador de água, o tocador
de jumentos e burros, o vendedor de frutas, o trabalhador
braçal da abertura de estradas
e de linhas de trens, parece que se esqueceu do passado.
Logo agora quando dentro
da política nacional existe um movimento crescente pelo
resgate e valorização deste
elemento.
Humberto de Campos, famoso escritor maranhense, citado em
trabalho recente de
Daniel C. B. Ciarlini quando da instalação da Justiça
Federal em Parnaíba, no dia 20
de agosto de 2008, lembra “... o majestoso mulato Benedito
Guariba, uma vez por ano
à frente dos seus caboclos improvisados em marujos
portugueses, alvoroça as ruas
arenosas de Parnaíba...”
Falava naquele momento de um negro, cujos descendentes ainda
estão por ali no
Macacal, hoje bairro de Fátima, que vinha trazer a público,
dos mucambos do Testa
Branca, sua cultura e sua arte aos festejos de Santo
Antonio, São João e São Pedro.
Antigamente se chamava Catanduvas, conhecido reduto de
negros valentes, fortes,
habilidosos na arte da palha, caça e cata de caranguejos.
Hoje é o famoso São Judas
Tadeu, bairro elegante da zona leste. Os remanescentes estão
praticamente espremidos.
Outro negro que teve e manteve fama de bom músico e
construtor de casas foi
Pedro Braga, criador da primeira banda de música de Parnaíba
e que injustamente
estava esquecido, até ter seu nome resgatado pelo
historiador Mauro Júnior e por sua
inspiração foi lhe dado o nome da corporação criada na
primeira década do século XX.
Mais adiante na política outros dois negros ousaram passar a
barreira do preconceito e
alcançaram relevo por algum tempo, Custódio Amorim e
Olegário Manoel Gonçalves,
como vereadores.
Por sinal e por que não dizer da falta de respeito e
ingratidão, quando há décadas
passadas se deu a construção de um anexo da Câmara
Municipal, sendo presidente o
negro João Evangelista, foi dado com direito a retrato e
placa na parede o nome em
homenagem ao vereador Custódio Amorim, já há muitos anos
falecido. Anos depois,
numa dessas reformas contumazes, salvo engano quando era
presidente Gerivaldo
Carneiro Benício, passaram o pincel na parede e retiraram a
fotografia, como para
esquecer de uma vez por todas que por aquela casa passou um
vereador negro.
Da mesma forma que a ingratidão e o preconceito foram usados
pelos vereadores,
inclusive sendo deselegantes com os contemporâneos, filhos e
netos de Custódio
Amorim, se deu muito antes com Olegário Manoel Gonçalves,
negro, poeta e vereador,
que no seu tempo de político foi apelidado até de O Gorila
Assassino, conforme
menciona o radialista Rubem Freitas em seu livro, Parnaíba
tem Memória, publicado
em 2007. Não sei se tem, me digam, mas os nomes destes dois
negros velhos nunca
foram lembrados a dar que fosse nome a um beco!
E a Parnaíba, que sempre se arvorou de educada e culta, se
permitiu tamanha
deselegância e falta de respeito. Mas onde estão os negros
da Parnaíba? Onde
estão os Macaé, os Surubacas, os Guaribas? Onde estão os estudantes,
estudiosos
e historiadores? Logo agora que a educação, no seu patamar
mais elevado que é a
universidade, onde a pesquisa e o registro histórico se
tornam mais que necessários para
a compreensão de nossa formação social, esta comunidade intelectual
faz vistas grossas
a tão importante data e registro. De repente até parece que
todo mundo na Parnaíba é
descendente de suíços!
Por: Pádua Marques